Gêneros Musicais

As 9 musas

A música é uma das marcas registradas do espírito do povo grego. A própria palavra música é de origem grega, relacionanada com as nove musas, deusas que na antiguidade eram evocadas para inspirar os artistas.

A arte musical está em todos os lugares e em cada momento da vida do povo grego, acompanhando desde cerimônias de casamento, a momentos festivos e despedida de entes queridos. Há, é claro, ritmos musicais em número suficiente para a expressão de todo o sentimento grego. De norte a sul da Grécia, das cidades às vilas e ilhas, há uma diversidade muito grande de formas musicais, instrumentos e formas de cantar.

Essa diversidade é percebida não só no espaço, mas também na passagem do próprio tempo. Desde a Grécia Antiga, a música evoluiu bastante, refletindo os aportes culturais dos vários povos que viveram ali, conviveram com os gregos ou os conquistaram.

Com o objetivo de apresentar um pouco dessa diversidade musical, especialmente para quem ainda não conhece muito a música grega, apresentamos abaixo os principais ritmos, com uma pequena explicação sobre suas características. O objetivo da lista é meramente didático, não tem caráter definitivo (e nem poderia!).

Rebetiko

Rebetiko

O rebetiko é muito conhecido fora do país como o blues grego. Ele tem uma história muito particular, marcada fortemente pelos acontecimentos que sacudiram a história do país desde a sua independência. É, por isso, um dos estilos musicais mais estudados da música grega.

O rebetiko é essencialmente um tipo de música urbana, surgido do seio das classes trabalhadoras, que nasceu em fins do século 19 e desenvolveu sua forma musical até mais ou menos a década de 1930. Inicialmente apareceu entre os trabalhadores dos portos de grandes cidades e depois moveu-se para os grandes centros urbanos. As canções geralmente falavam sobre violência, pobreza, injustiças, prisões ou abuso de drogas, quase sempre acompanhados pelo som do bouzouki, instrumento mais característico da música grega.

O nome rebetiko é de origem sérvia, palavra usada para designar sujeitos rebeldes e indisciplinados. As canções que pavimentaram o caminho para o surgimento do rebetiko apareceram na Grécia ainda no início do século 19, por volta da década de 1830, e eram chamadas de “mourmourika” (as canções murmuradas). Ao passo que a classe ricas e burguesas se divertiam com ritmos importados (como a polka), as classes trabalhadoras cantavam as mourmourika, expressando todo o seu descontentamento e posições políticas.

Chega então o século 20 e a terrível catástrofe de Smyrna, que expulsou de onde hoje é solo turco uma enorme população de origem grega, que lotou os subúrbios das grandes cidades, desempregados, desamparados, marginalizados e mesmo drogados. Na década de 1920 o próprio rebetiko começa a ser associado a canções que falam do uso de drogas como o haxixe (chamadas hashiklidika). Nessa época, o rebetiko incorpora-se às canções e tradições da Ásia Menor, como os “amanes” (tipo de canto longo e doloroso) e torna-se ainda mais diversificado.

Na década de 1930 a música passa por uma evolução, já que sai do tempo das criações anônimas para a época dos grandes compositores e cantores que se dedicavam à musica, especialmente com os cafés e tavernas que surgiam, como o famoso Café Aman.

Porém, nessa década o rebetiko sofreu um grande abalo. Devido às condições políticas da época, o estilo foi proibido na Grécia em 1936, considerado como de origem turca, o mesmo acontecendo na Turquia, considerado de origem grega. Apesar da proibição, canções continuaram a ser compostas, parando de ser gravadas apenas com a eclosão da Segunda Guerra Mundial. A música só voltaria a ser ouvida na década de 1960, trazida de volta pelo interesse de alguns grandes artistas.

Os maiores compositores desse estilo musical são Vassilis Tsitsanis, Markos Vamvakaris, Bayanderas, Perpiniadis, Tsaousakis, Giorgos Ksintaris, Giannis Papaioannou, Manolis Chiotis e outros.

Uma das melhores formas de conhecer uma parte da história desse rico estilo musical é assistir ao filme “Rembetiko”.

Abaixo a canção Stin Amfiali, do filme em questão, uma música da década de 1980 que toca no tema das prisões e das drogas, cantada por Takis Binis.

Laiko

Laiko é o nome que se dá à canção popular grega (laiko = popular, plural laika). Podemos dizer que, ao lado do rebetiko, é o estilo musical mais característico da Grécia, principalmente para quem não é grego. De certa forma, as canções laika são uma evolução do estilo rebetiko, sendo mais “fáceis de ouvir” e de apelo mais comercial que aquele.

Podemos identificar uma série de outros ritmos e danças que compõem esse gênero, como o nisiotiko, o syrtos, o hasapiko, o kalamantiano, o zeimbekiko, o syrtaki e o tsifteteli. Boa parte delas é embalada pelo som característico do bouzouki.

Diferentemente das canções do repertório rebetiko, as canções laika não chegam a tocar em temas mais pesados. A maioria delas fala de amor, mas também pode abordar temas como a dor, a angústia e as separações amorosas, temas bem mais amenos do que os tratados pelo rebetiko. Justamente por não ter uma identificação única com a classe trabalhadora, esse tipo de música conseguiu se expandir, especialmente com o crescimento do cinema, da indústria fonográfica (que procurava por canções com letras mais amenas e músicas mais refinadas) e das emissoras de rádio no pós-guerra.

Stelios Kazantzidis

Entre as décadas de 1960 e 1970, surgiram grandes intérpretes dentro do gênero como Stelios Kazantzidis, Marinella, Stratos Dionisiou, Vicky Moscholiou, Grigoris Bithikotsis e vários outros, sempre com sucesso estrondoso em todo o país. Ao lado deles, grandes compositores, como Giorgos Zabetas, Giorgos Mitsakis, Apostolos Kaldaras, Lefteris Papadopoulos e também alguns saídos dos círculos do rebetiko, como Vassilis Tsitsanis. Dentre eles, destaca-se a figura de Manolis Hiotis, criador do bouzouki tetrachordo (de 4 pares de cordas), considerado até mesmo por Jimi Hendrix como um dos maiores “guitarristas” do seu tempo, justamente pela velocidade com que tocava o bouzouki.

Juntamente com o sucesso do estilo, o bouzouki, antes associado às canções do rebetiko, conseguiu firmar-se como instrumento musical importante dentro da música grega, alcançando o status que ocupa hoje.

Após a década de 1980, o estilo assiste a uma espécie de renovação, passando a ser chamado de moderna laika (ou laiko-pop), considerada a corrente principal da música grega atualmente. Surgem novas vozes ao lado das já consagradas, que angariam grande número de seguidores, apresentando-se nos palcos mais importantes do país e com sucessos executados nas principais rádios e clubes noturnos (especialmente os chamados ellinadika, onde os DJs tocam essencialmente as canções laika contemporâneas). Algumas das grandes vozes incluem Dimitris Mitropanos, Eleftheria Arvanitaki, Haris Alexiou, Paschalis Terzis, Giorgos Dalaras, Giannis Kotsiras, Alkistis Protopsalti, ou Anna Vissi, Natassa Theodoridou, Antonis Remos, de sucesso mais recente. Alguns deles são considerados importantes artistas também dentro de outro universo musical, o chamado entechno.

Entechno

Entechno significa literalmente “canção artística”. É um gênero musical surgido (ou cuja denominação surgiu) no final da década de 1950, fortemente embasado em composições musicais mais rebuscadas, ora com acompanhamento orquestral, ora apresentando elementos dos ritmos folclóricos, e letras poéticas.

Os primeiros e mais renomados compositores e letristas do gênero foram Manos Hatzidakis e Mikis Theodorakis, seguidos por outros como Manos Loizos, Dimos Moutsis, Stavros Kouyoumtzis e Manos Eleftheriou. O termo “entechno” em si teria sido usado pela primeira vez por Manos Hatzidakis para se referir às letras dessas canções ditas mais “artísticas”. Dando voz à música e às letras produzidas por esses artistas estavam grandes intérpretes como Maria Farantouri e Nana Mouskouri.

Ao longo das décadas, o gênero foi evoluindo, diversificando seus temas e recebendo influências de outros estilos musicais. Na década de 1960, artistas como Dionysis Savvopoulos começaram o movimento neo kyma (nova onda), misturando o entechno e a chanson francesa. Na mesma década, especialmente durante a Junta que governou a Grécia de 1967 a 1974, surgiram as canções políticas com compositores como Mikis Theodorakis, Manos Loizos e Giannis Markopoulos. Já na década de 1980, entrou em cena uma mistura do estilo com o pop rock.

Atualmente, uma das maiores representantes da canção artística é a letrista Lina Nikolakopoulou. Suas letras têm características bastante peculiares, sempre carregadas de muito simbolismo e interpretadas por importantes vozes como as de Eleftheria Arvanitaki, Alkistis Protopsalti ou Haris Alexiou. Na composição musical, destacam-se nomes como Nikos Antypas, Giorgos Andreou, Stamatis Spanoudakis, Evanthia Reboutsika, dentre outros.

O termo “entechno” em si é carregado de controvérsias. Há quem diga que é difícil classificar músicas simplesmente botando nelas um rótulo. Afinal, o que não é “artístico” seria o quê? Há quem defenda que entechno é toda a música que não fique apenas nos clichês do gênero denominado “skyladiko”, ou seja, são aquelas músicas mais trabalhadas, cujo conteúdo não morre de um dia para outro. Por outro lado, não têm o apelo da música mais popular (Laiko), que fala diretamente à alma sem subterfúgios ou figuras de linguagem rebuscadas e viram hinos da música grega.